Gilmore Girls (ou Tal Mãe, Tal Filha, nome recebido no Brasil) é uma série dramática que estreou em outubro dos anos 2000 e terminou em 2007, com uma temporada especial em 2016. Conta a história de Lorelai e Rory, muito bonitas (isso é lembrado a cada 5 minutos de série), voltando à cidade natal para tentar reconstruir a vida. Produzida por Amy Sherman-Palladin (The Marvelous Mrs. Maisel, Bunheads), contando, no elenco, com Lauren Graham (Lorelai Gilmore), Alexis Bledel (Rory Gilmore), Kelly Bishop (Emily Gilmore), Melissa McCarthy (Sookie), Keiko AgenaYanic (Lane Kim), Scott Patterson (Luke), Paris Geller (Liza Weil), Jess Mariano (Milo Ventimiglia) e Jared Padalecki (Dean Forrester), Yanic Truesdale (Michael Gerard) e muitos outros.

Esse não é um post de hate sobre a série, preciso esclarecer isso antes de tudo. Eu gosto da série e tenho um grande carinho por ela. Como muitas pessoas, assisti Gilmore Girls no início dos anos 2000 quando passava aos sábados no SBT e naquela época eu era apaixonada pela relação próxima de mãe e filha das protagonistas, algo meio distante da minha realidade. Admirava muito a Lorelay, que eu via como uma mulher que, sozinha, criou a filha e tentava construir uma carreira.
Porém, maratonando a série Gilmore Girls já adulta, quando lançaram uma temporada final em 2016, teve outro impacto em mim e é isso que vou explicar melhor aqui e convidar vocês também a refletirem sobre isso.
Lorelay

Uma das protagonistas da série, foi mãe aos dezesseis anos e, muito bonita, volta à cidade natal para tentar reconstruir a vida. Pela diferença de idade, Lorelai é mais uma amiga da filha do que mãe, fazendo vez ou outra esse papel. Lorelai é imatura ao lidar com a mãe – é uma relação mais mãe-adolescente do que a que Lore tem com a filha de dezesseis anos. Emily é uma mãe controladora mas tenta fazer com que a filha e a neta desfrutem de todo o luxo e riqueza que seus pais conquistaram ao longo dos anos.
É contraditório o quanto Lorelai quer se apegar a seus princípios e ser totalmente independente, ao passo que aceita todo o suporte que eles podem oferecer na educação da filha. Isso pode ser justificado na relação materna de se querer o melhor para os filhos. Esse é um conflito que a personagem enfrenta ao longo das temporadas e o que mais dá profundidade à personagem: ela tenta ensinar à Rory que uma vida repleta de regalias é, na verdade, uma prisão, e que é importante que lutemos para alcançar as próprias conquistas.
Uma coisa cansativa é a questão da beleza das duas e da Lore ser constantemente confundida com amiga da filha. Isso nivela a maturidade da personagem com a adolescente que, por vezes, assume o papel de adulta nessa relação. Aliás, já disse o quanto as duas são constantemente lembradas pela beleza ímpar?
A temporada final, feita quase dez anos depois, só reforça a personalidade infantil da Lore. A personagem, tanto tempo depois dos últimos eventos, ainda está perdida na vida pessoal, na vida amorosa e em como ser suporte para a filha.
Rory

Rory estudou no melhor colégio da região, passou nas melhores universidades do país e ainda assim, com acesso e recursos fornecidos pela mãe e avós, não conseguiu construir uma carreira. Com a cabeça mais madura a gente vê os problemas de Rory que foi acostumada a ter tudo fácil e não consegue lidar com os “nãos” da vida adulta e com pessoas que não vivem em sua função e não são abrigadas a aturá-la.
Um contraste interessante vem com os ex-namorados de Rory: todos seguem a vida e se dão muito bem, na medida do que conseguem: montam um negócio próprio, assumem negócios da família ou correm atrás dos próprios sonhos. Enquanto isso Rory, que passa nas melhores universidades e tem uma brilhante carreira pela frente, está estagnada (tranca a faculdade quando recebe o primeiro “não” em um estágio), está presa na mesma personalidade infantil e inclusive sente inveja dos seus amigos.
A vida amorosa de Rory ´é um caos: ela trai seus namorados, é amante de outro e vai levando esse aspecto sem nenhuma construção realmente interessante. Ela é construída como uma pessoa meiga e a personagem reforça esse arquétipo de donzela, de “princesinha” – que a reprimem – ao passo que Rory é um pouco babaca em seus relacionamentos e mais irresponsável que o mais irresponsável dos personagens. Parece não ter aprendido nada com a história da mãe.
Rory, mesmo assumindo funções de responsabilidade na casa e na vida da mãe não tem nenhum aprendizado profundo. Ela continua mimada e imatura em relação a seus pares, mesmo depois de adulta e com anos de formada.
A última temporada tem um final nada criativo mas que talvez reforce um contraponto de Lore: Rory tranca a faculdade e vive um período sabático às custas da fortuna dos avós, fazendo tudo o que a Lore adolescente repudiaria. Então, Rory engravida de uma “ficada” com o ex que está comprometido, sem emprego, sem faculdade, sem networking, sem recursos tendo que contar com a mãe.
A oitava temporada, para as duas protagonistas, tem como elemento mais forte a estagnação: as duas parecem ter ficado paradas todo esse tempo. Como isso pode ser possível, mesmo numa ficção?
Personagens de apoio

Sookie e Lane sempre procuram ajuda das Gilmore e quase sempre são ignoradas porque elas estão, como sempre, ocupadas falando delas mesmas. É até triste a relação de amizade de Rory e Lane: ela nunca está lá quando a amiga precisa enquanto a amiga vive na sua casa.
Repare que elas mal dão ideia para os problemas das amigas e amigos e ok, são personagens de apoio mas também mostra o quanto as duas são egocêntricas. Fiquei tão revoltada que fui reclamar no twitter:
Tudo só pode ser sobre elas e qndo amigos delas vem desabafar dos problemas deles, elas ignoram e continuam falando delas #gilmoregirls — Lai (@lavaialai) October 19, 2016
A série parece ter medo de posicionar se Michael, aquele que trabalha com a Lorelai, é ou não gay (quando criança, entendi que fosse). O único negro do elenco reforçava o estigma de séries da época, em que parecia escolher negros apenas para preencher uma espécie de “cota”.
Paris é uma personagem que no início foi trazida para ser um contraponto à Rory, uma vilã adolescente. Ao longo das temporadas vai sendo mostrado um lado mais humanizado da personagem e ela vai crescendo de uma forma bem interessante, ao passo que Rory continua indecisa sobre tudo.
Luke é colocado na friendzone em todas as sete temporadas da série e ele funciona como um suporte emocional que a Lorelai não encontra nos namoros e encontros que arruma. Como ela está focada no próprio mundo, ignora os problemas que acontecem com os outros personagens, mostrando vez ou outra um pouco de empatia mas sem disposição de realmente ajudar. Soa repetitivo falar isso mas é um padrão em todos os personagens.
Uma coisa é a minha memória que lembra da série com muito carinho pois foi um bom entretenimento para uma época em que poucas séries eram protagonizadas por mulheres sem que fossem estigmatizadas de “loura burra”, obsessiva controladora ou gostosona. Qualquer adolescente que quer encontrar uma relação de amizade sincera com os pais vai encontrar conforto nessa série porque são relações fraternais bonitas que temos ali.
Porém, quando, já adultos e com muitas experiências acumuladas, voltamos à série, ela nos impacta de uma forma muito diferente: de como adultos mimados são problemáticos, de como não devemos servir a nossos amigos em troca de migalhas de atenção e como devemos ser sinceros com nós mesmos e com os outros à nossa volta. É uma série que vai ficar apenas na lembrança pois tenho receio de ver tudo mais uma vez e criar certo asco pelas personagens. Tô satisfeita do jeito que está hoje.
E vocês, o que acham da série?
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