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Foto do escritorLai Caetano

Shuri e a jornada da heroína em Wakanda Forever

Pantera Negra: Wakanda para sempre estreia hoje e tive a oportunidade de conferir o filme na pré-estreia. Contudo, alerto já no início que aqui terão pequenos spoilers leves, que muitos sequer consideram spoilers.

Uma delas é quem recebeu o manto do Pantera Negra e a gente até já comentou isso na reação aos trailers. Se você evitou assistir os trailers ou não quer saber a resposta, sugiro voltar nesse texto depois de ver o filme.

O filme

Pantera Negra 2 é um filme com várias mensagens fortes, dentre elas o empoderamento da mulher preta. Quero deixar claro que a minha opinião aqui está limitada à minha visão de mulher branca e aliada.

Já era de se esperar que haveria homenagens ao Chadwick Boseman, que faleceu em 2020 em decorrência de câncer. A dúvida maior, a despeito dos roteiros vazados, era como isso seria construído dentro do filme e a quem o manto do Pantera seria repassado, e a escolha de Shuri (Letitia Wright) foi tão natural quanto os quadrinhos.

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Por que? Porque não apenas isso já acontece nos quadrinhos, entretanto também foi uma forma de manter o legado de T´challa por meio da linhagem formada por pessoas éticas, diplomáticas, super inteligentes e orgulhosas de serem quem são.

A jornada da heroína

A jornada da heroína foi construída por Marie Murdock, com base na visão da psicóloga de que a jornada do herói de Joseph Campbell não era suficiente para construir uma narrativa sob a perspectiva feminina. Isso porque os desafios e obstáculos enfrentados por homens e mulheres são diferentes.

A jornada da heroína pode passar por todos os arquétipos elencados por Murdock ou por apenas parte deles. Não precisa necessariamente ser épica, como a de Campbell, mas pode ser se quiser.

De acordo com Flávia Gasi, a Jornada da Heroína não tem um vilão, é uma jornada interna de identidade, permeada de subjetividades. Vou passar por alguns desses elementos no tópico seguinte, associando com a história do filme.

A construção de Shuri no MCU

Primeiro, vamos relembrar as participações de Shuri no MCU. Sua primeira aparição ocorreu em Pantera Negra, a irmã do Príncipe T’challa que era um gênio e dominava diversas áreas relacionadas à tecnologia. Além disso, sabia técnicas de combate.

Responsável pela construção de inovações em Wakanda, também construiu o traje do irmão. Criou uma IA com quem se comunica – semelhante ao J.A.R.V.I.S de Tony Stark – entretanto sempre dá a entender que a tecnologia usada por ela era algo muito mais avançado.

Depois Shuri apareceu novamente em Vingadores: Guerra Infinita, lutando ao lado de wakandianos. Com um traje próprio e armas potentes, tudo construído por ela, enfrentou o exército de Thanos. 

Assim, até aqui a jornada de Shuri foi coadjuvante, mas com vários elementos que mostravam a relevância da personagem para a existência e manutenção de Wakanda. Ao mesmo tempo que era secundária, já que o foco era no Pantera Negra mesmo, também não era.

Em Pantera Negra 2, o filme começa explorando vários arcos e aos poucos Shuri vai se transformando em protagonista da própria história. A conversa que ela tem diretamente com um personagem específico só reforça isso.

A personagem não tem sua narrativa genuína dentro da jornada da heroína, mas sua construção passa por elementos interessantes que acredito valerem a pena pontuar, principalmente por se tratar de uma personagem preta nos cinemas.

A jornada de Shuri como heroína

O primeiro é a separação do feminino. A personagem nega logo no início, quando atribuem a ela a função de carinho e cuidado de um personagem enfermo, mas ela deseja buscar uma solução prática para a saúde dessa pessoa, sendo racional e metódica.

Shuri rompe com um dos ideais de sua família quando consegue perceber que ela quer vingança, quer fazer o vilão do filme pagar pelo que foi feito. Além disso, ela quer canalizar toda a sua dor nessa luta, mesmo que não tenha qualquer relação direta com o vilão.

Na aproximação com o masculino, o simbolismo é marcado por personagens que falam pouco, que possuem problemas de comunicação. Ela é pouco comunicativa e evita falar sobre o luto com a mãe, até que acaba cedendo por insistência da matriarca. A Rainha Ramonda, interpretada por Angela Basset, é um dos papeis mais fortes do filme, inclusive.

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Na ilusória crença no sucesso, Shuri acredita que salvar uma cientista é o que vai solucionar os problemas apresentados na história. Depois, ela acredita que receber o legado do irmão é a solução para todos os problemas de Wakanda, quando outros obstáculos já estavam sendo elaborados na história.

No “ventre da baleia”, o herói passa por dificuldades que irão fortalecê-lo. Na jornada da heroína é semelhante. Shuri pensa em tudo o que perdeu ao longo da sua jornada e usa isso para aceitar suas responsabilidades e se fortalecer.

Na parte de iniciação, é quando Shuri reflete sobre sua missão e decide sintetizar a flor, ingeri-la e visitar seus antepassados na esperança de se conectar com o poder do Pantera Negra. A heroína se sente “crua”, vulnerável, e é esse caminho que a incentiva a se conectar novamente com o feminino, com quem ela realmente é. 

Dois personagens agem como mentores de Shuri: a Rainha e outro que não vou relevar. Ambos são o “vovô aranha” da jornada da heroína e o mentor da jornada do herói e auxiliam Shuri na busca pelo sentido em sua jornada, lembram ela de coisas e valores importantes que a motivam.

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Shuri abraça o obscuro, o sentimento de ódio e vingança, e internaliza isso em seus valores. Ela se torna uma pessoa diferente de quem era no início, abraça tudo o que ela é, mesmo que tenha características que nem o irmão nem a mãe aprovariam. 

Nessa aceitação, Shuri vê o sagrado em tudo que lhe acontece depois e retoma seus vínculos com a família e suas origens. Ela deixa de ser dual e acaba sendo completa, numa união de todo o legado da família, os valores de sua origem e a desobrigação em dizer não às tradições (numa das cenas finais). 

O que esperar de Shuri daqui pra frente

A nova fase do MCU tem sido marcada por personagens femininas fortes e cada vez mais presentes dentro do universo dos super-heróis. Ficamos tão acostumados com isso que as protagonistas femininas chegaram e até hoje tem gente estranhando.

Viúva Negra foi deixada de lado por anos, sendo uma bengala para a caminhada de outros personagens, e Pepper Potts por muito tempo era o suporte, o estereótipo da secretária auxiliando o protagonista em tudo. Não foi muito diferente com Vespa e Wanda, ou até com Sylvie e Kate Bishop.

Honestamente eu sempre me perguntava se Potts não recebia acúmulo de função pelo trabalho de assistente da casa, da empresa, do Tonny Stark e ainda suporte emocional. Porém, em troca ela recebia também a amizade e o carinho dele, que no filme era colocado como suficiente (já que só depois ela realmente vira “sócia” ou CEO das indústrias Stark). 

Daí veio Capitã Marvel, filme que irritou uma parcela do público que não estava acostumada a ver personagens femininas não estereotipadas agindo como Tony Stark (arrogantes, não sexualizadas, inteligentes e com humor ácido).  Apesar de hoje Carol Danvers estar relegada a pequenas participações, foi um filme marcante em que o MCU deixou clara a mensagem, que foi reforçada muitas vezes depois em séries como Wanda e Visão, She Hulk e Miss Marvel, ou no filme Viúva Negra com a Yelena.

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Shuri foi, pra mim, a cereja desse bolo e eu fiquei muito feliz com o que eu vi e como isso foi construído. Pantera Negra 2 ficará marcado por muitas coisas, mas para mim o filme se tornou importante sobretudo por construir tão bem uma personagem feminina como Shuri.

Quero, de coração, que a personagem tenha cada vez mais espaço no MCU e que um terceiro Pantera seja feito. Quero ver Letitia crescendo no papel que, assim como Shuri, assumiu por conta de uma tragédia, mas que deu a ela uma grande oportunidade na carreira e na representação da mulher preta na maior franquia de super-herói dos cinemas.

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